Cartiê Bressão: "fotoetnografia" bem humorada do povo brasileiro


Eu sempre gostei de fotografar pessoas, paisagens e paisagens com pessoas. Isso começou ainda na infância, quando ganhei minha primeira câmera, uma Kodak Instamatic. Adorava selecionar momentos que visualmente me marcavam.

Naquela época era natural que eu registrasse os grupos de minha convivência: família e amigos. Só anos mais tarde, na faculdade, comecei a me interessar pelos estudos de fotografia e antropologia. Foi a partir daí que percebi que os meus registros fotográficos carregavam mais do que a memória da minha vida, carregavam registros culturais de vários lugares, ilustrados pela paisagem, a arquitetura, as roupas e até mesmo os cortes de cabelo específicos de vários momentos.

Ok! O click foi da minha mãe, mas foi feito na velha e boa Instamatic.

Na faculdade eu li e recomendo as obras de Rosane de Andrande e Luiz Eduardo Robinson Achutti. Ambos estudam a fotografia sob uma perspectiva antropológica. O professor Achutti trabalha com o conceito de fotoetnografia que é um campo de estudo, e também de produção, bastante fascinante. Já Rosane publicou Fotografia e Antopologia: olhares fora-dentro, obra ímpar e uma das minhas leituras favoritas. Para não virar uma postagem acadêmica eu não vou entrar no mérito da descrição de conceitos, mas, indico as obras dos dois autores para aqueles que desejam se aprofundar no assunto.

Toda essa introdução é para me fazer chegar em uma das iniciativas mais criativas da web nos últimos tempos, o tumblr Cartiê Bressão. A princípio mais um blog de humor, mas que, se observado com atenção, tem muito mais contribuições para nós leitores.

O título do blog, Cartiê Bressão, é uma alusão bem humorada ao nome de um dos fotógrafos mais conhecidos em todo o mundo, Henri Cartier-Bresson, que costumava fotografar cenas do cotidiano dos lugares por onde passava. Inspirado no fotógrafo francês, o blog reúne cenas do cotidiano de bairros da cidade do Rio de Janeiro. A maioria das imagens registra pessoas anônimas que têm um momento específico eternizado em um click e descrito com legenda divertida, publicada em francês "ao pé da letra", que é onde encontramos a maior carga de humor da proposta.

Eu acho divertido. Mas, acho divertido porque conheço a língua francesa, conheço o trabalho de Cartier-Bresson e consigo enxergar o humor da proposta. No entanto, eu consegui enxergar também um relevante trabalho de registro antropológico e de transmissão desse registro.

Não sei quem fotografa, porque o blog é mais um daqueles que preza pelo anonimato do autor, mas a seleção de imagens nos mostra de forma exemplar a realidade dos bairros do Rio de Janeiro através do modo de vidas das pessoas em diferentes momentos do seu cotidiano. Não deixa de ser um importante banco de informação e registro, assim como as fotos que fiz na minha infância.

Para ilustrar, escolhi três imagens do blog que reproduzo a seguir com suas respectivas legendas:

“vendeur de rue fait le Sergeant Pepper”, Arpoador — 2012

“dame tricotant sur le bus” Botafogo — 2012

“dansant et tournant en rythme partie”, Festa Junina — 2012


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